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Lugar de mulher é nos estádios


Escrito por Motorola

O Hello Moto foi conhecer a diretoria dedicada às torcedoras do clube Náutico do Recife

No país do futebol, o esporte ainda é largamente associado ao universo masculino. As profissionais ligadas à área, em geral, têm menos prestígio. E as torcedoras ainda têm de lidar com a frequente ameaça do assédio.

Mas, se depender de Tatiana Roma, essa realidade está prestes a mudar. A alvirrubra encabeça a Diretoria da Mulher do Náutico Capibaribe, que tem como objetivo aumentar a representatividade feminina no clube e combater o machismo.

Fundada em março deste ano, a iniciativa é pioneira entre os clubes brasileiros. O Hello Moto foi até a sede do time, no bairro dos Aflitos, no Recife, conversar com Tatiana e acompanhar um pouco das obras do estádio que era a antiga casa do clube e que passa por processo de reestruturação.

Tatiana Roma nas arquibancadas do Estádio dos Aflitos, que está em fase de reformas e sem data definida para a reinauguração
Tatiana Roma nas arquibancadas do Estádio dos Aflitos, que está em fase de reformas e sem data definida para a reinauguração

Lugar de mulher é onde ela quiser

Apesar de a presença feminina nos estádios ter crescido nas últimas décadas, as mulheres ainda vivem uma realidade de violência nas arquibancadas, no campo e por trás das câmeras.

Recentemente, uma ocorrência no estádio do Grêmio chamou especial atenção: uma torcedora foi assediada minutos antes do jogo, enquanto subia a esplanada da Arena. Ciente de que a atitude não pode ser tolerada, ela denunciou o agressor, que foi encontrado pela Brigada Militar e levado à delegacia do próprio estádio. O desfecho foi praticamente instantâneo e, como punição, o homem foi afastado pelos próximos doze jogos do Grêmio.

Tatiana ressalta como o caso é um bom exemplo da importância da denúncia e punição rápida. “Muitas vezes, a vítima tem medo de denunciar, principalmente em um ambiente como o estádio de futebol, onde você é minoria de gênero, mas não podemos naturalizar situações como essa”.

Na sua Diretoria, essa é uma das principais discussões levantadas, e completa: “Queremos mostrar que a mulher pode estar onde ela quiser, inclusive nos estádios. Seja como jogadora, como árbitra, como torcedora…E se ela não quiser estar em nenhum desses lugares, é direito dela também”.

Uma nova cultura

Durante muito tempo, a lógica do “pode tudo” reinou nos estádios, desde xingar o juiz até ofender torcedor do time rival. Agora, existe um movimento crescente que coloca em pauta questões em torno do racismo, homofobia e machismo no futebol.

Ciente dessa realidade, Tatiana propõe uma nova campanha para a reinauguração do Estádio dos Aflitos cujo mote é “estádio novo, cultura nova”. Ela explica: “Estamos remodelando o estádio e não podemos mais aceitar comportamentos de 10, 15 anos atrás. Se temos que educar o torcedor para que ele não invada o campo, agora que estamos investindo em vidros baixos no lugar de grades, temos que educar também para que ele aceite qualquer pessoa dentro do estádio. É um ambiente como qualquer outro e, portanto, ele tem que seguir as regras da sociedade, então a mulher deve ser respeitada”.

Para ela, esses tipos de campanhas são apenas o início de uma mudança muito maior que está se anunciando. “O futebol é provavelmente um dos meios mais machistas que eu já vi na minha vida. A cultura não se muda de uma hora pra outra, mas a gente tem que começar a plantar agora para ir colhendo no futuro”, acredita.

Além da luta constante contra assédios, a Diretoria da Mulher também tem trabalhado para elevar o número de sócias titulares do clube. Em uma das ações, mulheres que optassem pela titularidade não pagariam a primeira mensalidade. “Queremos desmistificar essa ideia de que a mulher, quando é sócia de um clube, é dependente do marido, pai ou irmão. Queremos que ela tenha o poder de decisão e de escolher o time ao qual ela quer se associar”.

Tatiana Roma experimenta uma das camisetas femininas da loja oficial do clube
Tatiana Roma experimenta uma das camisetas femininas da loja oficial do clube

Amor à camisa

Para além da vertente social, que engloba o bem-estar e o incentivo ao aumento de torcedoras nos estádios, a Diretoria também tem um braço comercial, que trabalha para que sempre tenha opções de produtos femininos na loja do Timbu.

Segundo Tatiana, o Náutico tem cinco camisas oficiais, mas apenas duas são femininas. A previsão é que, em breve, a conta seja equivalente. “Constantemente ouvimos coisas como ‘leva a P masculina ou a infanto-juvenil que é a mesma coisa’, mas não fazer um produto específico para o público feminino é, acima de tudo, uma atitude incoerente comercialmente. Normalmente a mulher vai comprar uma camiseta pra ela e acaba comprando para o marido e para o filho também. Isso é perder dinheiro”.

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No dia a dia, a Diretoria conta com o apoio do setor de marketing. A parceria rendeu ações como a do Dia das Mães, que veiculou histórias de filhos que foram ao estádio pela primeira vez com a mãe. “Tem essa ideia de que você precisa ir ao estádio com um homem do lado, com o pai, marido ou namorado. Mas tem muita gente que foi pela primeira vez com a mãe, isso é muito legal”, pontua.

Futebol feminino

No âmbito esportivo, a Diretoria tem trabalhado em prol da valorização do futebol feminino e de outros esportes praticados por mulheres dentro do clube. Um dos principais avanços nesse setor foi a possibilidade de o time de futebol feminino profissional treinar no CT do Náutico. “Pra você ter uma ideia, até o ano passado as jogadoras nunca tinham pisado no centro de treinamento do clube, porque nunca tinham deixado. Um lugar onde todos os outros times de futebol treinam, incluindo base. Felizmente tive apoio interno para mudar essa situação e já se vê uma diferença no desempenho delas dentro de campo, pois agora elas treinam com regularidade em um campo bom”.

Tatiana ressalta ainda outra desigualdade que foi sanada nos últimos meses: “Elas também nunca tinham andado no ônibus oficial do clube. São pequenas coisas que são muito importantes para que elas se sintam parte do clube”.

O próximo passo é expandir o calendário de jogos e investir numa maior profissionalização da categoria. “Como manter um time motivado se o calendário é altamente escasso? Como vou conseguir um patrocinador se não tenho jogo para expor a marca dele? No futuro eu espero que seja mandatório ter um time de de futebol feminino e que os salários praticados sejam iguais”, sinaliza.

Foto: Divulgação / Náutico

Representatividade

Se alguns desses avanços podem soar minúsculos para quem está acostumado a ter tudo, Tatiana cita um problema bem específico que só mulheres que frequentam estádios conhecem: a falta de estrutura dos banheiros femininos. “Constantemente eu calculava o tempo que eu estaria no estádio para não precisar ir ao banheiro, porque eles são terríveis. Além disso, os homens entram neles porque pensam que as mulheres não usam mesmo. Eu quero ter o direito de ir a um banheiro decente dentro do estádio, é o mínimo!”.

Dos assédios à precariedade das estruturas, vai-se construindo um ambiente hostil à presença feminina. “São elementos que para quem não é mulher não parecem grande coisa. Por isso é importante a representatividade, ter uma mulher para pensar nessas situações. Não é um trabalho fácil, ele não dá resultado imediato, mas aos poucos vai dando mais segurança para estarmos dentro dos estádios”, finaliza.

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